O termo “estigma” era usado na Grécia Antiga para
designar sinais corporais que desqualificavam o cidadão marcado. Escravos,
criminosos e traidores traziam essas marcas nos corpos, como forma de serem discriminados
em locais públicos.
Hoje em dia, apesar de não haver uma marca clara
nas pessoas, usamos estigmas para categorizá-las segundo normas dentro de
conceitos como “normalidade” e “aceitação social”. Ou seja, nós julgamos as
pessoas conforme o que considerados “normal” ou “aceito socialmente”.
Já deu pra perceber o erro inerente a tal
julgamento. Ainda assim, muitos doentes, não bastasse o sofrimento com sua
doença em si, tem que sofrer com esses estigmas também. Confira:
1 – Câncer de cólon
Câncer colorretal é bastante curável se detectado
nos estágios iniciais. Porém, como não tem sintomas, ou mesmo que os sintomas
apareçam, os pacientes podem ficar constrangidos em falar sobre diarreia e
movimentos intestinais anormais com seus médicos, esses tumores acabam
crescendo e se tornando mais complicados.
A melhor forma de diagnosticar o câncer de cólon é
a detecção precoce, com testes como a colonoscopia. Mas as pessoas não fazem
esses tipos de exame; ninguém quer se submeter a tal desconforto, ou constrangimento.
Nesses casos, falar sobre “doenças escondidas” pode
ajudar as pessoas a procurar assistência médica. De acordo com um estudo
americano de 2003, mais pessoas fizeram colonoscopia depois de um especial que
passou na TV que conscientizava de sua importância.
2 – Disfunção erétil
Nem precisamos falar do estigma que envolve a
disfunção erétil. Apesar de ter diminuído nos últimos anos, ainda é muito
difícil para os homens admitir a disfunção sexual. De acordo com um estudo de
2010, só metade dos homens com disfunção erétil procura tratamento.
Mas todos deveriam procurar, porque a condição tem
tratamento e pode ser curada ou remediada.
A impotência atinge até 25 milhões de brasileiros acima dos 18 anos pelo menos uma vez na vida. O número é maior em homens na faixa etária dos 40 anos. Todo ano, segundo a Sociedade Brasileira de Urologia, um milhão de casos são registrados no país.
A impotência atinge até 25 milhões de brasileiros acima dos 18 anos pelo menos uma vez na vida. O número é maior em homens na faixa etária dos 40 anos. Todo ano, segundo a Sociedade Brasileira de Urologia, um milhão de casos são registrados no país.
Só que o Centro de Referência da Saúde do Homem,
órgão da Secretaria de Estado da Saúde em São Paulo, por exemplo, só recebe
cerca de 300 pacientes com o problema por mês. Mais: eles descobriram que 90%
deles são sedentários – a ponto de não fazerem exercício nem de fim de semana –
e 40% deles também são fumantes. Se você não quiser procurar tratamento, pelo
menos converse com seu médico, porque algumas mudanças no estilo de
vida já podem lhe ajudar.
3 – Problemas “masculinos”
Alguns transtornos femininos vêm com sintomas que
desafiam nossas definições culturais da feminilidade. A Síndrome dos Ovários
Policísticos, um distúrbio hormonal que pode causar infertilidade e diabetes, é
muitas vezes marcada por pelos faciais excessivos. Distúrbios como hiperidrose,
ou transpiração excessiva, podem ser estigmatizantes para ambos os sexos.
Mas a desordem vem com bagagem extra para as mulheres. “É uma espécie de ‘característica mais masculina’ do que feminina, por isso é bastante constrangedora”, diz Sophia Wastler, que tem hiperidrose. Porém, a maioria desses problemas tem tratamento e as pessoas perdem mais sofrendo em silêncio do que buscando um médico.
Mas a desordem vem com bagagem extra para as mulheres. “É uma espécie de ‘característica mais masculina’ do que feminina, por isso é bastante constrangedora”, diz Sophia Wastler, que tem hiperidrose. Porém, a maioria desses problemas tem tratamento e as pessoas perdem mais sofrendo em silêncio do que buscando um médico.
4 – Psoríase
A psoríase é uma doença imune crônica que provoca
pele escamosa, manchada e/ou rachada. Essas marcas podem ser difíceis de
esconder, e muitas vezes constrangedoras para os doentes. Seu embaraço é
multiplicado por pessoas que veem a psoríase e se afastam do doente,
acreditando equivocadamente que a doença é contagiosa.
Como uma das condições mais estigmatizadas do
mundo, afeta bastante a vida dos pacientes. De acordo com uma pesquisa
realizada em 2008 pela Fundação Nacional de Psoríase nos EUA, 58% das pessoas
com a condição disseram que se sentiam envergonhados, e um terço disse que
limitava suas interações sociais e encontros por causa da psoríase.
5 – Intestino irritável e
inflamado
Qualquer doença relacionada com excreção corporal
vem amarrada em algum tipo de estigma. A Síndrome do Intestino Irritável (SII)
e a Doença Inflamatória Intestinal (DII) não são exceções. Esse último é um
conjunto de síndromes, todas marcadas pela inflamação dos intestinos. O
primeiro é marcado por dor intestinal, cólicas e prisão de ventre ou diarreia,
mas sem a inflamação.
Em geral, os pacientes com SII se sentem mais
estigmatizados. A diferença pode ser porque, sem uma causa clara física, eles
podem sentir que a sua doença não é levada tão a sério.
6 – Obesidade
O estigma de gordura tornou-se global. De acordo
com um estudo de 2011, publicado na revista Current Anthropology, quase não há
culturas que não associem a obesidade com preguiça e gula, apesar do fato
de que muitas dessas mesmas culturas também veem gordura como um sinal de
riqueza.
Muitos do que tem vergonha do excesso de peso dizem
que são preocupados com a saúde. Mesmo que seja esse o caso, a vergonha saiu
pela culatra, pois pesquisas descobriram que a vergonha e o estigma
apressam o declínio físico em pessoas obesas.
7 – Lepra
Lepra, ou hanseníase, é uma das doenças mais
“fantasiadas” na imaginação do público. Alguns dos mitos mais comuns são de que
a doença é extremamente contagiosa e de que partes do corpo do doente
simplesmente caem.
Aqui cabe um famoso “nada a ver”. Mais de 90% das
pessoas que entram em contato com as bactérias que causam a lepra combatem a
doença sem sintomas e sem se tornarem contagiosas (embora seres humanos possam
pegar a doença por contato próximo com tatus). A doença também é curável com
antibióticos. Se o doente não procurar tratamento, pode ser que tenha lesões na
pele, mas, não, suas mãos, pés e nariz não vão simplesmente cair. Pesquisadores
sugerem que tal lenda nasceu porque a condição pode causar dormência, colocando
as pessoas em maior risco de lesões acidentais ou amputação.
Enfim, está na hora de tais crenças absurdas como
essa saírem de cena. Muitas vezes apelidada de “doença do estigma” (mesmo
“leproso” virou termo proibido, pelo preconceito a ele associado), a lepra foi
tratada como sinal de impureza ou pecado por muitos anos, e quem já leu
histórias antigas, principalmente bíblicas, sabe que a regra durante séculos
foi discriminar os doentes e privá-los do convívio social. Se, por um lado,
podemos perdoar nossos antepassados por eles não terem informação, ignorância
hoje não é mais desculpa.
8 – Câncer de Pulmão
Como a obesidade, esse câncer é uma condição que as
pessoas tendem a culpar a vítima por ter a doença. A ligação entre fumar
cigarros e câncer de pulmão leva as pessoas a
acreditar que os que sofrem do câncer “provocaram isso” em si mesmos. Mas, na
verdade, milhares de pessoas que nunca fumaram têm câncer de pulmão a cada ano.
Além disso, pessoas que fumaram não são menos dignas de tratamento do que as
que nunca fumaram: não cabe a nós julgar quem vive e quem morre, não é mesmo? O
direito a tratamento médico é previsto em lei para todos os cidadãos.
9 – HPV
O papilomavírus humano (HPV) infecta a pele ou
mucosas, muitas vezes de forma assintomática. Ele pode causar verrugas
vaginais, e algumas cepas do vírus podem causar câncer cervical em mulheres, o
que o torna uma perigosa doença sexualmente transmissível (DST).
Existe até vacina para o vírus, mas é difícil para
os governos fazerem campanhas ou a tornarem obrigatória, porque a transmissão
da doença é através do contato sexual. Especialistas argumentam que a vacina é
mais eficaz antes da pessoa tornar-se sexualmente ativa, mas há quem diga que
torná-la obrigatória ou incentivá-la pode estimular os adolescentes a se
engajarem em atividade sexual precoce. Ao mesmo tempo, “melhor prevenir do que
remediar”, não é mesmo?Tirar um pouco do estigma da doença poderia ajudar na
conscientização com responsabilidade.
10 – HIV/AIDS
Dá para enumerar diversos estigmas dessa doença:
“doença de gay”, de comportamento promíscuo, de “drogado”, etc. Aparecendo no
início dos anos 80 como uma síndrome misteriosa que atingia em sua maioria
homens gays, o “comportamento imoral” virou o símbolo da propagação da Aids,
que se tornou mais uma daquelas doenças em que “culpamos a vítima”.
De acordo com um estudo de 1999, 52% dos
norte-americanos ainda associava HIV com homossexualidade, apesar do fato de
que, já naquela época, apenas cerca de um terço dos novos casos de HIV eram de
homens gays. Em 2006, um relatório da Kaiser Family Foundation descobriu que o
americano fazia uma confusão significativa sobre o HIV: 37% deles acreditavam
erroneamente que o HIV podia ser transmitido pelo beijo, enquanto 32% pensavam
que poderia se espalhar através de copos compartilhados. Se a população pensa
isso, já dá para imaginar como os doentes são vistos/tratados na sociedade.
Segundo o Ministério da Saúde brasileiro, desde o
início da epidemia, em 1980, até junho de 2011, o Brasil teve 608.230 casos
registrados de HIV (condição em que a doença já se
manifestou), de acordo com o último Boletim Epidemiológico. A morte pela doença
tem diminuído, e os casos são apenas ligeiramente mais comuns em homens do que
mulheres. Veja outras estáticas e saiba como se prevenir aqui.
O item 9 e 10 dessa lista se referem a doenças
sexualmente transmissíveis, mas essas não são as únicas estigmatizadas. No
geral, pessoas com esse tipo de doença podem ser vistas como “promíscuas” ou
“desleixadas”, percepção em muitos casos errônea, e sempre preconceituosa.
Bônus: Depressão
Hoje, a depressão não é tão estigmatizada, já que
foi bastante estudada e agora é mais bem compreendida.
Só que ainda falta compreensão: muitos casos da
doença não são levados a sério, mas precisariam. Existe depressão de todos os
níveis, de leve a grave, e nem todos são tratados de acordo.
Um estudo divulgado pela Organização Mundial de
Saúde (OMS) revolveu que, em 2011, o Brasil foi o país com a maior prevalência
da doença, com 10,8% da população apresentando o distúrbio mental.
Em 2008, o Suplemento de Saúde da Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílios mostrou que a depressão é a quinta doença de maior
ocorrência no Brasil.
No mundo todo, estima-se que a depressão afete 121
milhões de pessoas. A OMS acredita que em pouco mais de 10 anos, a doença será
a segunda mais comum no mundo, chegando ao primeiro lugar em 2030. Ela também
será a maior responsável por mortes prematuras e anos produtivos perdidos dado
seu potencial incapacitante. Mais: pesquisas indicam que depressão na meia
idade leva a um maior risco de desenvolver demência mais
tarde (como Alzheimer), além da condição estar ligada a diversas outras
doenças e problemas.
É preciso que as pessoas fiquem atentas aos
sintomas da condição, para tratá-la de acordo. Remédios e assistência
psicológica estão entre os tratamentos mais procurados.